quinta-feira, 13 de outubro de 2016

Outra Chance - Parte 3



Parte 3

                      O DOUTOR DEUS.

- Boa tarde Lola, como você está?

 E tem como estar ruim com essa visão do paraíso? Sério, meu psicólogo era um Deus em forma de gente!

- Estou bem. Na verdade não sei nem porque eu estou aqui. Olha só minha cara de feliz! – Abri um sorriso irônico e ele sorriu também. - O que eu tenho doutor? É grave? Vou precisar  colocar a camisa de força?
- Me diz você. Porque te mandaram aqui?

Respirei fundo.

- Meus pais acham que eu surtei desde que meu namorado morreu.

Ele me olhou como se eu acabasse de dizer algo muito fácil.

- O que foi?
- Fala como se fosse a coisa mais natural do mundo.
- E não é? Todos morrerão um dia.
- Com toda certeza. E como isso te afeta?
- Eu não estou entendo sua pergunta doutor. Isso aqui virou uma entrevista?
- Lola, eu entendo o que está tentando fazer, mas uma hora terá que deixar isso tudo sair de dentro de você.
- De verdade, não sei do que está falando.

Ele me olhou torto e anotou alguma coisa na prancheta velha dele.

- Lola, me diga a primeira coisa que vier a sua cabeça.

Eu ri.

- Desculpa. Como?
- Isso mesmo que você ouviu. Me diga a primeira palavra que vier a sua cabeça, sem pensar. Pode ser o que estiver sentindo ou algo que tenha vontade.
- Doutor como isso vai me ajudar?
- Você é desconfiada demais. Não me veja como seu doutor, me veja como seu amigo.
- Desculpa senhor...
- Mendes, Charlie Mendes. Mas pode me chamar de Charlie.
- Olha, isso aqui não vai rolar. Desculpa.

Ele olhou para meu braço enfaixado.

- O que houve com o seu braço?
- Eu me cortei com um caco de vidro.
- Algo se quebrou?
- Não doutor, eu me cortei. Me cortei de propósito. 

Ele anotou.

- Por que fez isso?

Eu não consegui responder. Respirei fundo antes que as lágrimas caíssem. Me levantei.

- É melhor eu ir. – E saí pela porta sem ouvir o que o Deus diria.

Entrei no primeiro banheiro à minha frente, olhei para o espelho e a imagem de uma garota desleixada, de cabelos ruivos mal presos e olheiras profundas surgiu na minha frente. Dei um murro no espelho para aliviar aquela angústia. Quando saí, um garoto alto e branco como leite, de tênis surrados e camiseta verde musgo apareceu em minha frente. Só podia ser ele mesmo, Will. O meu vizinho irritante.

- Esquentadinha! Você por aqui. Finalmente resolveu se internar?
- Se um dia eu me internar, a culpa vai ser sua.
- Hey! Calma aí okay? Você não é a única com problemas aqui.
- Você não sabe o que é ter um problema. Sua vida é perfeita. Você tem tudo e todos que ama. Então não me peça pra ter calma. Até mais Will.

 Saí, e fui andando para casa. Estava sem paciência até para esperar o ônibus.

 Cheguei em casa e subi as escadas sem olhar para os lados. Papai e mamãe provavelmente estavam sentados no sofá assistindo suas séries e Rebecca minha irmã mais nova, certamente não me viu chegar por estar ocupada demais pintando suas unhas. Bati a porta do quarto e então perceberam minha presença. Me joguei em minha cama e parecia que eu iria afundar e atravessá-la a qualquer momento com meu peso. 

 Olhei para o nada por um tempo, imaginando como seria se eu fosse completamente invisível. Em cima de uma mesinha de canto ao lado da minha cama, um caderno velho adormecia. Meu diário que apodrecia com minhas palavras vazias. Era uma das únicas coisas que me faziam bem naquele momento. Como de costume, o peguei e comecei a escrever para algum ninguém.

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