quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Cauã.

Hoje eu estava no ônibus. O mesmo de sempre. Lotado como sempre. Eu, de pé, como sempre.
Balançava de um lado para o outro num calor insuportável. O mesmo calor de sempre.
Já estava ficando entediada naquele longo caminho da faculdade de volta para casa,
quando três crianças entraram no ônibus, que talvez não fosse o mesmo ônibus de sempre deles.
Haviam duas meninas, e um menino. As meninas deviam ter 9 e 11 anos.
Mas o que mais me chamou a atenção foi o menino, Cauã. Devia ter uns 9 ou 10 anos.
Estava descalço, e devia estar voltando da escolinha ou de algum parquinho na rua.
Ficou do meu lado e não quis se segurar em nenhum apoio e eu disse que era melhor se segurar ou iria cair e poderia se machucar! E ele apenas abriu as pernas e se equilibrou sem medo daquele ônibus lotado.
E eu? Eu estava louca pra sair dali. Não suportava que me apertassem entre as costas ou a barriga, suava e morria de sede. E ele? Ele estava lá mostrando que podia dominar aquele espaço. Um espaço que era só dele, e ele não precisava de apoio algum. Porque ele tinha coragem.
Engraçado. Eu morrendo de sede e louca pra sair dali. O Brasil ficando sem água. E o Cauã, o Cauã só esperava que o ônibus não freasse bruscamente e atrapalhasse seu equilíbrio.
Foi então que a menina, a mais velha, pegou as mochilas dos mais novos e sentou-se nas cadeiras preferenciais. Aquelas vermelhinhas sabe?! Sentou feliz pois estava cansada. Ela brilhava suor.
Enquanto os pequenos brincavam de se equilibrar, ela apenas segurava as mochilas, sentada, tranquila.
Então chegou uma senhora. Não era velha não. Mas por respeito...
A mulher perguntou para a criança se ela não ia levantar, e se desceria logo do veiculo. 
Ela também estava cansada. 
A menina disse que desceria três pontos a frente.
A moça a olhou com desprezo e perguntou mais uma vez se ela não ia levantar.
A criança na maior inocência respondeu que estava sentada para segurar as mochilas dos irmãos.
Mas a mulher não se importou. Ela era mais velha (nem tão velha), e também estava cansada e disse que queria se sentar encarando a garotinha como se ela fosse um ser de outro mundo.
Foi quando a menina entendeu que precisava levantar e dar o acento para aquela senhora. 
Ela apenas pegou as mochilas tentando se equilibrar em uma mão só, e ao mesmo tempo ficar de olho nos irmãos pequenos. E eu só observava. A minha sede passou. E eu não ligava mais para o calor.
Eu só queria que aquela garotinha chegasse logo em casa para se sentar em um sofá confortável sem ninguém a encarando. E o Cauã?
Eu só queria que ele não caísse.
Eles desceram do ônibus e fiquei imaginando como seria a casa deles.
Provavelmente algum lugar simples, cheio de paz, por ter a presença do sorriso daquelas três crianças que fizeram de um transporte público, diversão e conforto.
Onde outros olhos, como os meus, não enxergam o mesmo.
E o Cauã? O Cauã somos todos nós, antes de encarar a realidade da vida.

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