sexta-feira, 14 de março de 2014

Me rendo

Me rendo.

Ela sentou em baixo da árvore, encostou sua cabeça nos ombros dele, levemente foi se aconchegando.
O céu e as nuvens eram testemunhas daquela estranha, porém bonita amizade que ali crescia.
Me rendo.
Ja era tarde, e mesmo assim o dia parecia estar apenas começando.

- Não quero ir. - Ela disse.

- Você não precisa ir. - respondeu ele - Um dia todo mundo vai. Mas não significa que você tenha que ir.

- Mas se todo mundo..

- Todo mundo, desse mundo. Anjos não morrem. - interrompeu ele.

Havia lágrimas em seus olhos, mas também havia um sorriso em seu rosto branco que aos poucos se tornava rosado pela timidez. Ele sabia que a hora chegaria, mas esperava que não fosse tão rápido. Esperava que mesmo depois que ela o deixasse na Terra, estaria ao seu lado o tempo todo. Ele esperava.

Me rendo.

A noite estava brilhante.
As estrelas enfeitavam o céu negro como cascatas de purpurina. O problema no coração se tornava microscópico diante da imensidão criada por Deus.

- Seu problema é tão minúsculo diante d'Ele, que Deus precisa de uma lupa para te curar. E ele vai! Você vai ver! - Ele disse

- Meu coração já está alegre o suficiente. Você pode parar, antes que eu exploda por favor?! - Ela sorriu

- Ainda não! Falta um coisa.

Ele foi se aproximando do seu rosto frio, a acariciou com as pontas dos dedos, tirou seus cabelos negros do rosto, e com um toque suave, beijou seus lábios rosados. O primeiro e talvez o último dos beijos que fizeram o tempo no mundo parar.

"Prometa que não vamos nos apaixonar" ( ele disse há um mes atrás)

- Mas você disse que...

- Eu sei o que eu disse. Me rendo. - confessou ele

- Eu vou morrer. - ela choramingou

- Não, apenas seu corpo vai. Mas você vai estar aqui, sempre, sempre. - ele disse apontando para o coração e com lágrimas que não paravam de cair.

Eles ficaram ali, debaixo da árvore, sobre o céu infinito. Envolvidos num abraço sereno, amável.

Me rendo.

Uma vez disseram que não se pode evitar a morte. Mas podemos talvez enganá-la. Um doador apareceu sabe-se lá de onde, sabe-se lá quem. Mas agora ela estava ali, viva, e podia viver mais e mais, por anos e anos..

Seu coração novo batia, batia forte, e apaixonado. Mas onde estava seu amor?
No jornal uma notícia a fez entender, mesmo que não quisesse, tudo.

"Jovem morre em acidente, ao voltar para casa"

Em um soluço, ela aperta forte as mãos.

- Anjos não morrem.

Leka Ribeiro

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